fevereiro 26, 2016

Paz.

O João era um menino muito inteligente. Tinha 10 anos e era negro. A mãe era negra também, e o pai tinha-os deixado havia 6 anos. As lembranças que ele tinha do pai eram muito poucas. Não sabia se tinha voltado para a Nigéria, a sua terra natal, pois apesar de ter nascido em Portugal, sentia a Nigéria como o seu país, deixando tudo para trás. Queria lá ir, um dia, quando tudo estivesse resolvido. Acreditava no coração bom dos Homens. A mãe dizia-lhe para esquecer aquela terra, mas João não era capaz. Era pequeno demais para se lembrar dos avós, ou dos tios. O pai e a mãe eram as únicas pessoas de quem ele se lembrava.

A Nigéria estava em conflito e por isso os seus pais não tiveram alternativa senão fugir. O conflito era sobretudo religioso. Os pais de João eram cristãos, e apesar de não ser religioso, respeitava todas as religiões, incluindo os muçulmanos. Segundo os pais tinha sido por causa dos muçulmanos que tinham fugido da Nigéria. Mas João sabia que haviam pessoas boas em todo o lado. 

A Nigéria tinha vários problemas de direitos humanos (em Portugal estes também existiam, mas a escala era menor). João sofria abusos todos os dias, quer físicos, quer psicológicos, devido à sua cor, devido à sua mãe ser auxiliar na escola que frequentava, e até por ter boas notas. Ele sabia que não havia meninos maus. Apenas alguns menos informados, que julgavam que era a cor que definia os pensamentos. Claro que na Nigéria os problemas eram outros: execuções  e uso excessivo da força por parte das forças de segurança; impunidade para os abusos cometidos pelas forças de segurança; detenções arbitrárias; prisão preventiva prolongada; corrupção judicial, violações, tortura, tráfico de seres humanos, trabalho infantil. Era melhor ele nem pensar nisso, dizia-lhe a mãe, mas ele não entendia muito bem isto. Eram cidadãos do mundo que estavam a sofrer aqueles abusos todos, como queria a mãe que ele não pensasse nisso?!

Os abusos que João sofria, quando comparados com os que os meninos da idade dele sofriam na Nigéria, eram tão sem importância! Por isso é que ele não se queixava a ninguém. Queria era saber dele, da mãe e das notas na escola. Os professores elogiavam a capacidade do João para absorver tudo o que lhe era ensinado, e João pensava que não estava a fazer nada mais que a sua obrigação, pois queria dar um futuro melhor à mãe e a ele próprio. Alguns professores sabiam dos abusos que ele sofria. Já tinha chegado a levar uma tareia por causa da cor. Achava que isso não era um problema de tolerância. Era sim um problema de falta de respeito e de ignorância. Nunca na vida pensou em bater a um menino só por causa dele ser branco! 

O racismo era, segundo o João, o maior flagelo da sociedade. Não importava muito existir computadores e tecnologia de ponta, quando ainda se pensava assim. Tudo tinha na base o racismo. Fosse pela cor, pela religião, ou por qualquer outra coisa.Tudo tinha por base percepções sociais das diferenças as pessoas. Mas diferente não é pior nem melhor. É só diferente! A quantidade de pessoas que já deram a vida por motivos como este...

João só queria a paz. Gostava que todas as pessoas se respeitassem e pensava que assim o mundo seria um local melhor. Mas, como a mãe dizia, sonhar não chega.



Beijinhos

Sem comentários:

Enviar um comentário